Há muito tempo que não corro. Há muito tempo que não escrevo.
Parece que passou uma eternidade, mas passaram apenas duas semanas. Como dizia Natália Correia num seu belíssimo soneto "tudo é eterno num segundo" .
Há apenas uns dias atrás, buscava alento e conforto na corrida e em algumas palavras que tentavam exorcizar fantasmas. Não sei se conseguia, mas tentava. Tinha coragem e força para isso. Participava nas corridas e era feliz nesses momentos. Agora, creio que corria, mas era numa fugida louca da realidade. Numa corrida sem tréguas contra o desânimo que eu impunha a mim mesma.
Hoje, não posso escrever. A realidade é sofrida em demasia para caber em palavras. O presente tão presente e o futuro tão incerto que não permite ser expresso numas quantas frases soltas.
Não sei quando voltarei a correr. Não sei se voltarei a calçar umas sapatilhas e a sair por aí, contra o vento e os pensamentos negros que teimava em deixar atrás da porta fechada.
Comecei uma outra corrida e, agora, quero ver portas abertas e barreiras caídas. Porém só vislumbro portas fechadas e barreiras erguidas. Nesta corrida não preciso de sapatilhas e o treino faz-se à medida que os minutos se escoam e as horas dão lugar a outras horas...
Perto de mim, há uma pessoa que não desiste, que teima em vencer e em viver: é a minha filha. Faz uma corrida solitária contra um invasor mortífero. Luta desigual, mas luta heróica da sua parte. Gostaria que todos a conhecessem e que o seu exemplo de vida, de coragem, de abnegação, pensando nos outros mesmo quando o seu sofrimento é atroz, fosse lição de vida para muitos. Quantos desperdiçam a própria vida...quantos desejariam poder viver...
Talvez um dia, quando o tempo permitir algum distanciamento tente pôr em palavras a sua história de vida. Ficará sempre aquém do seu testemunho maravilhoso de fé e coragem. Será um pálido reflexo do ser angelical que Deus quis me dar por filha, mas dá-la a conhecer será o mínimo a fazer, tentando infundir coragem a quem se sentir desalentado.
Aguardo um milagre e não quero perder o fôlego na sua súplica. Como quando comecei a correr..."se correrres e não conseguires falar é porque estás a ir depressa demais". Mas eu quero uma estrada para o céu para nela correr e ainda que chegue ofegante, bastar-me-á que num derradeiro sopro de vida, consiga alcançar a minha prece.
Aqui, neste mundo virtual, a quem existir com fé, peço que se juntem a mim em oração nesta luta pela vida.
Por ironia, a última prova em que participei foi precisamente numa corrida contra o cancro...
Bem hajam.
Ana Paula Pinto