existe sempre alguém ...passo e fico como o universo...
31
Jan 08
publicado por alemvirtual, às 09:37link do post | comentar | ver comentários (4)

Faz hoje 5 meses que a minha filha partiu. 153 dias. 3672 horas. Uma eternidade.

 

Estas são as palavras com que inicei um pequeno livrinho que relata um pouco da sua passagem na vida...

 

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Era o ocaso do dia 31 de Agosto do ano de dois mil e sete.

O céu azul, salpicado de castelos brancos de nuvens, tomava uma tonalidade púrpura, assinalando o entardecer. O astro-rei descia no horizonte. Um chilrear ensurdecer de pardais, recolhendo aos plátanos que os protegiam da noite, fazia-se ouvir. Parecia que o tempo tinha parado, mas a nota alegre dos pequenos pássaros, abrigando-se na ramagem das árvores, contrastava com o silêncio amargo que entre o grupo de familiares e amigos se tinha instalado.

 Era o ocaso de mais um dia estival. Tinha sido o ocaso da tua vida.

Neste entardecer, despojaste-te do teu corpo e partiste. Ele ficou, imóvel, indefeso, sem vida. O corpo de uma jovem mulher, com ar de menina, que a todos tinha encantado. Os seus olhos maravilhosos estavam fechados, porém, contemplavam já, o que transcende o olhar humano.

Esta é a tua história. Uma história de vida, de uma vida que não cabe em palavras. Esta é a história da vida de uma estrelinha que passou na terra e deixou um rasto de luz. Esta é parte da vida de uma jovem, a quem tive o privilégio de chamar filha.

 

Com amor,

 

mãe

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NATÁLIA CORREIA - Creio nos Anjos
 
Creio nos anjos que andam pelo mundo,
Creio na deusa com olhos de diamantes,
Creio em amores lunares com piano ao fundo,
Creio nas lendas, nas fadas, nos atlantes,

Creio num engenho que falta mais fecundo
De harmonizar as partes dissonantes,
Creio que tudo é eterno num segundo,
Creio num céu futuro que houve dantes,

Creio nos deuses de um astral mais puro,
Na flor humilde que se encosta ao muro
Creio na carne que enfeitiça o além,

Creio no incrível, nas coisas assombrosas,
Na ocupação do mundo pelas rosas,
Creio que o amor tem asas de ouro. Ámen

30
Jan 08
publicado por alemvirtual, às 14:05link do post | comentar

 

Sou amante da boa mesa. Quero dizer, de comida.


 

Há uns tempos que aparece na TV um sugestivo anúncio publicitário ao Risotto. Irresistível...

Ontem, decidi que o jantar seria isso mesmo: Risotto. Bem, foi de comer e chorar por mais.


Claro que a receita é genuinamente, “ à minha moda”



Risotto de Espargos e Camarões


Ingredientes


Camarão (bem “crescidinho”)

Arroz (risotto)

Espargos verdes

cebola

alho

azeite

caldo de marisco

acafrão

tomilho

vinho moscatel

piri-piri


Cozer os camarões com um pouco de sal (o suficiente para temperar sem salgar a água, já que o caldo se aproveita). Deixá-los bem rijinhos (1 minuto de fervura)

Retirar os camarões, deixá-los arrefecer. Guardar o caldo da cozedura.


Num tacho picar a cebola e o alho e levar ao lume com o azeite. Deixar refogar um pouco. Quando estiver lourinho, juntar o arroz sem ser lavado, o caldo de marisco, um cálice de moscatel e uma colher de sopa de acafrão, umas gotas de picante e deixar apurar o refogado. Juntar pouco a pouco o caldo coado. Deve cozer durante aproximadamente 12 minutos. Rectificar o sal.

Por fim, e antes de apagar o lume, juntar os espargos cortados em pedaços (os enlatados é só cortá-los) e os camarões.

Apagar o lume e “abafar” o tacho (que é como quem diz, tapar, envolver com um pano e esperar alguns minutos)


Servir tendo o cuidado de dispor os camarões em coroa no exterior da travessa, intercalados com alguns espargos inteiros que se guardaram e o risotto ao centro.

Fica muito colorido. Extremamente atractivo, a confirmar que “os olhos também comem”.


Como a Margaret dizia, estava “miserável”.


27
Jan 08
publicado por alemvirtual, às 19:25link do post | comentar | ver comentários (7)

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O "romance" na chegada a Sintra...pontes entre lados...ou passagens aéreas entre sonhos

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Os cerca de 1500 participantes (no total de inscrirtos) à partida

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O Daniel, o António, eu e a Ana (da esquerda para a direita ainda em Sintra

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(foto de WWW.AMMAMAGAZINE.COM)  (quase à chegada à meta)

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No regresso...o oceano...refulgente

 

E pronto. Já está. Não se “acabou a luz” e eu “acabei a empresa”.

A despeito da má (péssima) preparação física (na realidade mais a falta dela), da negativa condição emocional e psicológica, malgrado o tabaco e as poucas horas de sono (induzido), consegui. “Venci” a serra, que é como quem diz, “conclui os 17 Km (quase) do Grande Prémio “Fim da Europa”. E, ontem à noite, imaginava já estas palavras. Poderiam ser escritas?

 

Não sei se foi, simplesmente, o fim de uma corrida ou o fim das corridas. Hesitei até antes do início. Valeria a pena? Indecisa um dia antes, ora decidindo não ir, ora querendo muito ir. Continuo a não saber se quero, mas gosto e, sobretudo, ela gostava…

E quem me viu ali, correndo, gracejando e sorrindo, imaginou, por breve instante, o tormento interior? E os dilemas? Bem, mas isso é outra conversa, faz parte de outra reflexão… Cada um, correu com o seu mundo “às costas” e eu corri com o meu. Vamos à prova.

 

Subidas íngremes e descidas abruptas. É assim esta prova. Uma prova que é um hino ao esforço e à resistência...à capacidade de recuperar para voltar a subir...Um assalto ao oceano verde...

 

O património construído é soberbo, mas o paisagístico é indescritível…Quem conhece Sintra, a serra e a magia que encerra as encostas escarpadas, mergulhando em direcção ao azul do mar, sabe do que falo. E quem não conhece, sonhe e, quando percorrer aquelas paragens, verá a realidade suplantar o próprio sonho. Paisagem bucólica, perdida no tempo, que desejo eterna como um tesouro, impossível de ser corroído.

 

A Fonte Mourisca de onde partimos era já prenúncio de um percurso destinado a ficar gravado na memória, como as histórias das “Mil e uma noites” se gravaram na infância e me fizeram sonhar, ao longo dos anos. Ainda, hoje, simbolizam o universo mágico e fantástico das histórias contadas ao serão, ou lidas no aconchego da cama quentinha, nas manhãs de Inverno. A minha mãe era uma excelente contadora de histórias. Sobretudo das que nasciam, assim de repente, da imaginação, mas também das dos livros e dos artigos de jornal. Histórias mirabolantes, esotéricas, fantasiosas…de fadas e duendes…de “almas penadas” e de príncipes encantados…de fábulas, de…tantas, tantas…todas, ou quase com uma moralidade facilmente entendível.

 

 O Oriente fascina-me. Mas também o Ocidente e esta ponta mais ocidental onde corri. Recortes extremos do meu país, tão extremos que sentimos delinear-lhe a silhueta como mãos apaixonadas percorrendo o corpo amado.

 

As altas chaminés do Palácio ficaram para trás. Rapidamente avançámos para a serra. E mergulhámos num mundo verde. Era como se a Mãe Terra chamasse por mim. Respondi, intimamente ao seu apelo e misturei-me com a macieza da terra castanha e elevei-me até à copa das árvores. Percorri com a seiva os troncos altaneiros e desci com heras enlaçadas.

 

Chamavam-me a atenção para a estrada que serpenteava e regressei à corrida. Ladeada pela Ana e o António subia cada vez mais alto. À frente, nas curvas caprichosas da encosta surgiam manchas coloridas como pinceladas num fundo verde. Eram os que nos precediam.

 

Parecia que o sol se tinha eclipsado. A sua luz filtrada pelo arvoredo quase não chegava a ser suficiente para fazer do dia, dia. Era lindo…Aqui uma frescura feita quase obscuridade, ali uma clareira de um brilho ofuscante…

 

Lembrei-me de que, algures naquela serra, há muito se confundiu com a própria natureza, as cinzas, lançadas ao vento, da mãe de um amigo. Intimamente, rezei uma Ave-Maria, por ela e pela minha estrelinha que deve brilhar acima das copas frondosas, no firmamento nocturno.

 

Passaram 8 Km. Uma subida surgiu. Seria a última.

- “Depois a descer”… O António ia antecipando os acidentes do relevo…preparando-me. A Ana começou a ficar para trás. Perdi-a de vista, o ziguezague ocultava-a. Avançámos com passo lento.

- Ela apanha-nos na descida. – dizia o António.

Assim foi.

 

O oceano surgiu repentinamente, lá ao fundo. Via a brancura da espuma e o azul metalizado da água.

E começámos a descer. Sem a resistência das subidas, podíamos agora abrandar o esforço e “deixarmo-nos ir” – como dizia o meu parceiro desta luta.

A descida pareceu-me quase gigantesca. Custa-me descer. Mais difícil que subir. Não sinto o esforço da subida, nem a acidez nos músculos retesados, nem a pressão de uma respiração pesada, mas não gosto de descer.

Chega a Ana. Voltamos a estar os três, como em quase todo o percurso. Ela gosta das descidas. Distanciou-se uns metros que eu já não consegui anular.

Ainda tive fôlego para agradecer as palmas e incentivos que ouvia.

-Força, menina! E eu sorria...

 

Eis o Luís, de máquina em punho, captando o sorriso à chegada. Um aceno…

A Meta e um piiiiiiiiiiiiii ao pisar o tapete. 1 h 38m e 28 s. Desliguei o cronómetro.

 

Uma tenda e as mesas onde deveria ter sido servido quase um banquete. Apenas queria água e saí com dois bolinhos no guardanapo. Iria oferecê-los ao Luís. Mas não consegui dar-lhe esse “miminho”. Comecei a caminhar em sentido inverso. Perdi-o de vista e perdi o grupo. Eles, inteligentemente, esperaram perto da tenda. Andei quase 2 Km. Quando me convenci de que não deveriam estar tão longe, voltei para trás. De novo até à Meta… Encontros e desencontros…da vida e da corrida…

Rostos que começam a ficar amigos…

 

Prova que faz jus ao fantasma da dureza…mas que vale cada instante de esforço…

 

 

Se houver outras, talvez um espírito diferente…o espírito de quem resiste…a coragem de ser diferente…e o sonho da liberdade…reviver Zeca Afonso…em Grândola.


23
Jan 08
publicado por alemvirtual, às 21:43link do post | comentar

Ontem, escrevi esta carta.

Amanhã, irei enviá-la a duas entidades.

Hoje, resolvi colocá-la aqui.

 

 

 

Assunto: Pedido de esclarecimento sobre procedimento clínico

Pedido de esclarecimento sobre procedimento administrativo


 


 

Duas situações diferentes mas verificadas no mesmo processo clínico, dois pedidos de esclarecimento, motivados pela necessidade de saber ao certo o que se passou e se determinaram ou não o desfecho da situação clínica vivida pela minha filha, estão na origem desta exposição, os quais passo sucintamenrte a apresentar:


 

Em primeiro lugar e para justificar a linguagem utilizada, devo dizer que não detenho conhecimentos científicos na área da medicina, assim, peço desculpa se não conseguir expressar-me utilizando correcta e adequadamente a terminologia dessa área. No entanto, pernso que, será facilmente endendível as dúvidas apresentadas, por mim, enquanto mãe. Peço uma resposta, de acordo com o efectivamente ocorrido e em termos que a consiga endender.


 

Questão nº1)

Faz amanhã, dia 23 de Janeiro, exactamente, um ano que a minha filha Ana Margaret (Processo Clínico do IPO, Nº 90 28 47) realizou uma PET, no IPO de Lisboa, a fim de confirmar a localização e a extensão das lesões cancerígenas (metásteses de melanona). Sabíamos que um pouco acima do mamilo direito existia uma metástese (confirmada por citologia) e, segundo nos informaram, a Tomografia por Emissão de Positrões, mostraria com maior precisão, não só essa lesão, mas todos os órgãos e as outras possíveis lesões.

Claro que rezámos para que não houvesse mais nada para além da conhecida (o que já era bastante grave), mas infelizmente a PET revelou que o ou os ovários estavam atingidos, “provavelmente com metásteses”. Foi submetida a cirurgia no dia 13 de Março de 2007.

Terminada a cirurgia, fui informada pelo cirurgião de que a mesma tinha corrido bem, sendo que “duas lesões na mama foram retiradas, a totalidade do ovário direito e parte do esquerdo. O útero não estava atingido. Pela palpação todos os órgãos estavam bem, sem mostra de metásteses.” No entanto, o cirurgião iria propor quimioterapia. Eu, feliz pelo sucesso da cirutgia, pensei que seria apenas necesário algum tempo para preparar emocionalmente a minha filha para esse tratamento. Em resposta a essa minha pretensão, foi-me dito que a quimioterapia nunca se iniciaria “antes de provavelmente quinze dias”. Com esta ideia, se passaram alguns dias. A Margaret compareceu às consultas do pós-operatório e estava receptiva à quimioterapia (como aliás a tudo o que pudesse significar ajuda). A decisão do tratamento dependia do grupo de melanoma (conforme me foi dito). Acontece que na consulta de grupo, à qual eu e o marido da Margaret assistimos, nos foi dito que não se iria recorrer à quimioterapia. Os rostos descontraídos, até sorridentes e as palavras “está a correr tudo bem” fez com que saíssemos do hospital, completamente eufóricos e felizes.

A Margaret sempre apresentou sintomas dolorosos que não se desvaneceram com a cirurgia, mas como diziam que eram “dores migratórias”, e para as quais foi prescrito “Relmus” (pelo próprio médico que tinha sugerido quimioterapia) - um medicamento do tipo “não faz bem nem faz mal” (passe a expressão vulgar) que funcionaria como relaxante muscular, acalentávamos a esperança de que desaparecessem com o decorrer do tempo e, na minha ignorância de medicina, achava natural a persistência das dores, atribuindo-as à recente intervenção cirúrgica. No entanto, as dores não desapareciam nem nunca desapareceram antes pelo contrário. Foram aumentando de intensidade.

Na primeira consulta de Medicina Oncológica – especialidade para a qual a Margaret foi encaminhada - (após a consulta de grupo-melanoma atrás referida) foi solicitado à Margaret uma nova PET. Se se confirmasse a inexistência de lesões, a quimioterpia não seria adoptada, caso contrário “estudar-se-ia a situação”. (Um comentário: Desta consulta, ressaltam as emoções intensas, negativas, a brusquidão, a crueza e a impiedade nas palavras dirigidas. Após o relato breve do historial, desde o aparecimento do sinal na pele até ao diagnóstico de melanoma maligno e ao historial clínico após o diagnóstico, as palavras acusatórias “pois é, deixam chegar a este ponto e depois o que é que querem?” ficaram a pairar no ar e gravaram-se para sempre no meu coração de mãe. Talvez, com maior intensidade no dela, mas a minha filha nunca me acusou. Dizia, “nunca digas que tens culpa porque tu não adivinhavas”. E eu, nunca mais me mostrei culpada. Mas sinto-me. Obrigada, Srª Drª por me fazer sentir ainda pior)

Infelizmente para a Margaret, o exame realizado a 9 de Maio de 2007 (PET) e cujo resultado soube no dia 11 (e não é congruente com o relatório do realizado em Janeiro), confirma a continuação da lesão apresentada e revelou ainda a existência de inúmeras mestásteses a nível ósseo. A angústia dessa notícia é indescritível. Desde esse dia que coloco a mim mesma a pergunta (e ela enquanto foi viva também a colocava):

Se tivesse feito logo quimioterapia, ou seja, a iniciar-se ainda em Março, bem como uma PET imediatamente antes ou/e depois da cirurgia, as coisas teriam sido diferentes? Ter-se-ia conseguido controlar a doença? Ter-se-ia evitado a rápida progressão e o desenlace fatal? Porque não foi adoptada a decsião do médico que a operou e se esperou mais de dois meses para reconhecer a necessidade da quimioterapia? Porque se “camuflavam” as dores com analgésicos e relaxantes musculares e não se procurou perceber a sua origem? (é esta a minha questão). Ah! E por favor, não me digam que a quimioterapia não é preventiva no caso de melanoma. Eu apenas quero saber porque razão, houve uma recomendação e essa mesma proposta não foi seguida. Porquê? Preciso de saber se nada podia ter sido alterado, se o destino estava mesmo traçado. Mas ainda assim, preciso de saber as RAZÕES que motivaram esse procedimento. Passar da manhã para a tarde do mesmo dia (11 de Maio) de Ben-u-ron para injecção de morfina e comprimidos de morfina, podem crer que no mínimo é chocante. Chocante para o doente e chocante para a família.


 

Questão nº 2)


 

A Margaret foi acompanhada no IPO desde Julho/Agosto de 2004. Sempre nos foi dito que “se quiséssemos, podíamos consultar alguém no estrageiro” (esta era uma questão que a Margaret colocava muita vez, à sua médica” - como ela dizia e cuja resposta afirmativa lhe transmitia uma sensação de segurança, de que havia ainda muitos recursos). Ora, quando as metásteses chegaram aos ossos, quisemos ir ao estrangeiro. Estados Unidos, Alemanha, Inglaterra, França ou mesmo Espanha (por ordem de prioridades). Pediu-se cópia do processo e relatório clínico para concretizar essa pretensão. Só encontrámos dificuldades. Após muita insistência, e já alguma exaltação e impaciência por parte da família, é que se obtiveram esses elementos fundamentais para uma outra opinião clínica. Foi numa segunda-feira, dia 26 de Junho.

Porque razão houve tanta dificuldade a obter esses elementos? Não deverá haver uma maior abertura e uma maior receptividade quando um doente apresenta a intenção (e o requerimento) de consultar um outro especialista e ober uma segunda opinião? É um direito consagrado e previsto no nosso quadro legal. A primeira vez que esses elementos foram pedidos foi no dia 18 de Maio, por mim que era a mãe – enquanto ela estava em consultas de preparação para a colocação de um catéter. Todos os dias perguntava por eles e a resposta que me era dada (pelas funcionárias administrativas) era de que o processo da Margaret andava sempre de um lado para o outro e não havia oportunidade de elaborar o relatório. Mais tarde, não posso precisar o dia, mas está registado no processo com toda a certeza, foi a própria Margaret que, legitimamente, solicitou esses elementos. Andou de uma lado para o outro, dentro do IPO, com muito esforço. De uma gabinete para outro gabinete, pois as orientações, os procedimentos a seguir não eram precisos. Mas conseguiu. Apresentou o pedido. Muitas dificuldades, muitos impedimentos, muita demora... Porquê? Não era direito dela?


 


 

Resta-me dizer que a Margaret faleceu no dia 31 de Agosto. Após uma luta muito grande pela vida e pela dignidade na doença. Do seu imenso testemunho de coragem e confiança inabalável nos médicos que a seguiam, falarei uma outra vez, através de meios mais adequados e em locais próprios.


 

Agora, como mãe, quero ver esclarecidas as minhas dúvidas ou será que me vêm dizer que o dever de sigilo médico a que estão obrigados me impede de obter respostas?

Não pretendo acusar ninguém, nem tenho elementos para tal. Acho (e ela também achava) que até determinada altura o seu acompanhamento e a relação com o IPO eram excelentes. Seria mesmo? Foi até ao fim?

São dúvidas que permanecem.

Ela não volta. Como pessoa de fé, aceito a vontade de Deus, mas quero saber se alguém neste processo “cruzou os braços” porque ela não foi de certeza.

Bem sei que, inicialmente, terei sido eu por ignorância, mas penitencio-me por isso a todos os momentos que passam. Já agora, as campanhas de sensibilização para a prevenção do cancro da pele não são nada claras. Falo como leiga no assunto, mas conhecedora da terrível dimensão do sofrimento que pode causar.


 


 

Muito grata pela atenção dispensada.


 

Com os melhores cumprimentos.


 

Ana Paula Soares Pinto


 

Sobreda, 22 de Janeiro de 2008


17
Jan 08
publicado por alemvirtual, às 09:28link do post | comentar | ver comentários (5)

 

http://www2.uol.com.br/debate/1252/fotos/mulher01.jpg

Ontem disseram-me: "escreve com ironia sobre isso. é o que resulta melhor neste país"

 

Claro que só posso começar com ironia, mas nunca falar com ironia sobre a avalanche de indignação e revolta (motivada pelo sofrimento, sobretudo) que nos invade, sempre que se anunciam medidas do género e, inevitavelmente, nos fazem reviver outras situações.

Passo a explicar-me, ou melhor, reforço o pedido de explicações, FEITO HÁ MESES ATRÁS, a quem de direito, às cabeças iluminadas e de ENORME sentido de justiça social,  defensores e praticantes convictos de autênticas políticas sociais! Apologistas da exclusão, da segregação e de umas quantas hipócritas  atitudes, camufladas sob o apanágio de estimular, incentivar e proporcionar a igualdade de oportunidades e acesso de TODOS a uma vida mais saudável. Neste caso, baixando o IVA na prática de actividades desportivas.

Pois, que se promovam e criem, respectivamente hábitos e condições, para a adopção de estilos de vida saudável, acho MUITO BEM. Reconheço o mérito de tal (é sinceramente) e congratulo-me por ser cidadã deste grande país (ironicamente)! Mas, respondam -me agora, Senhores Ministros, membros do governo a quem EU NÃO AJUDEI a eleger (aliás, se mudassem os nomes, os rostos e a orientação política, os resultados seriam diferentes ou manter-se-iam os mesmos?? Eterna questão, tal como discutir o sexo dos anjos), repito, expliquem-me lá, como se eu fosse muito burra, (talvez seja e não consiga compreender a lógica que superintende em tão benevolente acção) por que razão, existem condições para reduzir o valor de IVA nesta situação e continua a persistir a situação caricata, abusiva, repugnante de se APLICAR 21% DE IVA  NA AQUISIÇÃO E ALUGUER NOS SEGUINTES ARTIGOS:

 

CADEIRA DE RODAS 

CAMA ARTICULADA

ALMOFADA

COLCHÃO ANTI-ESCARAS

ARRASTADEIRA

CHUVEIRO PARA CAMA

CREMES E AFINS DE GAMAS CONSIDERADAS "DE BELEZA" MAS UTILIZADAS PARA TRATAMENTO DE SEQUELAS DE RADIOTERAPIA E CLOIDES CIRÚRGICAS

???????????????

 

 

Pois é. Isto ainda não consegui entender. Bem, nem pensem que sou contra a medida anunciada, ontem, pelo governo. Sinto é a memória da minha filha insultada quando penso na situação que viveu, desprotegida por toda e qualquer medida governamental e de quantos necessitam de ajudas técnicas e outros produtos indispensáveis a alguma qualidade de vida, na vida que se apaga e estabeleço comparações com aquilo que se entende por PRIORITÁRIO nas questões de saúde.

 

A Margaret teve sempre (ou pelo menos, gosto de pensar assim) tudo quanto foi possível adquirir, ou pelo menos o indispensável, para enfrentar a sua doença. Mas há quem não possa assumir essas despesas, ou será que não há? Será que 200 ou 300 € de reformas e pensões (grande parte dos nossos idosos, aufere pouco mais que isso) chegam para cobrir as despesas de uma vida diária e ainda mais as de saúde?  Muito mais que isso (não sei nem vou querer saber) pagávamos nós na farmácia e já deduzida a comparticipação do nosso sistema de saúde!

Tudo se paga! Até a MORFINA!!!

 

Até uma cama articulada para quem estava imobilizada totalmente (nem sequer estava em recuperação, como acontece por vezes, o doente obrigar-se a imobilização por isto ou aquilo). As lesões na coluna com a progressão da doença, remeteram-na para a paralisia total, em questão de horas.

Agora, digam lá, é justa a minha revolta quando ouço o nosso governo, envaidecido ao máximo, anunciando estas medidas? Será legítimo aplaudir quando estou prestes a explodir de indignação?

Não consigo. Há medidas boas, sim. Esta será uma delas - vejamos os resultados. Mas, Senhores Ministros, há ainda muito por fazer.

Venham-me lá falar de PROTECÇÃO NA DOENÇA!!!!

 

 

 

Já ouviram falar da pirâmide de Maslow? Olhem com olhos de ver para o Zé Povinho e tirem as vossas conclusões.

 

Eu, sempre que puder, falarei e quando não puder falar, espero que outros o façam por mim.

 

"Há sempre alguém que resiste, há sempre alguém que diz não...."


15
Jan 08
publicado por alemvirtual, às 15:25link do post | comentar | ver comentários (8)

foto retirada de: http://mauromars.no.sapo.pt/blogimagens/sintra/sintra.jpg

 

 

Pimeiro foi o nome que me despertou a atenção.

Fim da Europa? Correr "onde a terra se acaba e o mar começa" 

 

 Com maior justiça este verso se pode aplicar ao Cabo da Roca.

 

 

 

(recordando, algumas estrofes do Canto III, Os Lusíadas

 

 "Eis aqui, quase cume da cabeça
De Europa toda, o Reino Lusitano,
Onde a terra se acaba e o mar começa,
E onde Febo repousa no Oceano.
.....................................................

 

 

 

Prova dura (dizem)...Mas nas minhas veias corre o sangue lusitano (não sei quantas gotas terão inscritas em si a coragem e a bravura do "peito ilustre". Mas, algures dentro de mim, a herança, perdida num intrincado "mapa de tesouro", existe.  E teima em deixar marcas. E persiste. E insiste em fazer-se sentir para ser descoberta...Torna-se presença; ténue presença, como luz pardacenta da manhã.

E num impulso, inscrevo-me. Coragem? Bahhh... Loucura, sim. Não. Loucura, não! Mais a audácia de quem age por impulso, inconsequentemente. Não ponderei. Chega de factores de ponderação! E lá se vai por terra a bravura dos meus ancestrais. Irreflectida? Basta de reflexões. Talvez seja e só instinto de sobrevivência. Descendente lusitana...cerrar os dentes, fechar os punhos, firmar os pés e partir à conquista não sei de quê. Tal como outrora, saltitar pelas serras, entre trilhos e penedos. De rocha em rocha, sobre os tufos das urzes, embriagando-me com o lilás rosmaninho, sussurrando às libelinhas que voam, poupando a formiguinha indefesa...

Subir a serra guiando-me pelos altos cumes verdejantes...

Descer ao encontro das vagas que esmorecem a meus pés.

 

Serra e mar... Contrastes...como eu.

 

Sem treinar. 17 Km. Poderei?

 

"Esta é a ditosa pátria minha amada,
A qual se o Céu me dá que eu sem perigo
Torne, com esta empresa já acabada,
Acabe-se esta luz ali comigo.
............................................."

 

Ou acabo a "empresa" ou a "empresa" acabará comigo.

Dia 27 de Janeiro.

 

Cabo da Roca

 

www.portugalvirtual.pt/.../images/sintra-001.jpg

 

 

 


10
Jan 08
publicado por alemvirtual, às 11:27link do post | comentar | ver comentários (1)

Hoje, procedo ao envio do segundo pedido de aquisição da sepultura da minha filha, que transcrevo abaixo.

 

Por ligações afectivas com Constância (toda a gente necessita de se sentir pertença de algum sítio, de ter raízes, e as nossas estão na Vila-Poema) ela foi aí sepultada, no dia 1 de Setembro de 2007. Dois dias depois de completar 24 anos.

Solicitei autorização para comprar a campa. Foi negada. Solicitei autorização para revestir a sepultura. Foi negada.

Hoje, insisto nesse pedido e resolvo colocar aqui cópia da carta enviada.

 

A minha irmã reside em Constância e trabalha no concelho. Foi Presidente da Junta durante muitos anos. Renunciou ao (creio eu, terceiro mandato) por razões de sáude. Eu trabalhei em Constância durante mais de 10 anos. E antes de aí trabalhar e passar os dias já gostava de Constância e participava na vda social e comunitária por razões afectivas.

Fui professora de Ensino Especial no concelho. Fui Coordenadora da Equipa de Apoios Educativos de Constância, Barquinha e Entroncamento. Fui Vice Presidente do Conselho Executivo do Agrupmento de Escolas de Constância (quando se constituiu em Agrupamento). Fui representantante da Educação na Comissão de Protecção de Crianças e Jovens de Constância. Fui elemento do Conselho Municipal de Educação de Constância. Fui elemento do Conselho Municipal de Segurança de Constância. Fui Secretária e Presidente da Associação de Geminação Constância/Fondettes. Fui e sou associada de outras associações. Fui uma pessoa activa e dinamizei várias iniciativas no âmbito das funções que exercia. Participava, envolvendo-me ao máximo, quantas vezes, com prejuízo da atenção, cuidados e tempo que devia dedicar aos meus filhos...

Deixei Constância por razões de reorganização da minha vida pessoal.

Tudo quanto fiz, voltaria a fazê-lo com gosto e amor pela terra a que chamo "minha". Gratuitamente. Desinteressadamente. Não esperei retribuições. Agora, espero somente um "sim" da autarquia para ter a certeza de que a minha filha encontrou um local onde possa descansar eternamente. E um "sim" para colocar uma "colcha de renda" na sua "camita". Essa colcha só poe ser um mármore frio, mas ainda assim...

 

Não mereço atenção especial por ter desempenhado algumas funções de responsabilidade em Constância. Exerci-as com amor e com o brio profissional que me era possível. Apenas as referi para que se depreenda a entrega pessoal que dei. Se fosse outra qualquer pessoa, sentir-me-ia no mesmo direito de pedir e no mesmo direito de ouvir um "sim".

Resta dizer que sou amiga de todos os elementos (ou da maior parte deles) com responsabilidades na vida do município. Mas não é em nome dessa amizade que peço. É como mãe que deseja ver algo mais digno na sepultura da filha que um punhado de areia...

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http://outra_alma.blogs.sapo.pt

 

                                        http://sol.sapo.pt/blogs/alemvirtual/default.aspx

 

Ana Paula Soares Pinto

Rua Curado Ribeiro, nº 50

2815-681 Sobreda




Exmº Senhor

Presidente da Câmara Municipal de Constância

Estrada Nacional, nº 3

2250-028 Constância


 




Assunto: Pedido de Aquisição de sepultura/pedido de revestimento de sepultura



Em 10 de Setembro de 2007, solicitei a Vª Exª autorização para proceder à aquisição da sepultura da minha filha ANA MARGARETE PINTO COTOVIO DIAS MARTINS, cujo funeral se realizou a 1 de Setembro desse mesmo ano (E9 do Cemitério de Constância) e autorização especial para revestir a mármore a campa, se não me fosse permitido adquirir já o terreno, uma vez que as vendas se encontram suspensas por decisão camarária. A minha pretensão foi indeferida.


Insisto e renovo esse pedido.


Solicito que a interdição à aqusição de sepulturas no Cemitério de Constância seja revista. Caso não me seja permitido, de imediato, proceder à compra do terreno onde o corpo da minha filha repousa, solicito autorização para colocar um revestimento de mármore na sua sepultura. Esta é a última coisa que posso fazer pela Margarete e não pretendo desistir dela. Continuarei a insistir neste pedido, as vezes que forem necessárias, até conseguir uma resposta favorável. Tal como não desisti (nem ela) da luta pela vida (ainda que o cancro a tenha vencido) também não pretendo desistir da luta pelo seu descanso eterno, na localidade à qual sempre nos sentimos ligadas afectivamente e à qual chamamos “nossa terra”.


Aproveito para desejar Votos de um Bom Ano a todos os funcionários da autarquia, na pessoa do Sr. Presidente, com especial relevância para os coveiros que tão carinhosamente cuidam das campas dos nossos entes queridos.


 

Na expectativa de uma resposta de Vª Exª que espero seja positiva, agradeço desde já toda a consideração que essa edilidade possa conceder a este pedido.



Com os melhores cumprimentos.


Ana Paula Soares Pinto


Sobreda, 10 de Janeiro de 2008


07
Jan 08
publicado por alemvirtual, às 13:26link do post | comentar | ver comentários (1)

20050105_-_Chuva_-_Wlady

galeria.brfoto.com.br/showphoto.php?photo=315...

 

Corri no último dia deste (para mim, terrível) ano de 2007. Pela manhã, fui ao Parque da Paz e, após uns momentos de recordaçõe dolorosas  naquelas pedras de entrada, onde a minha estrelinha se sentou uma última vez, lá fui eu. Fugia mais, do que corria. Fugia de tantos e tantos momentos de dor indescritível, dA corajosa abnegação, das súplicas caladas, do "Oh, mãe... oh, mãe..." antes de partir...queria fugir da vida que não desejei e sempre sonhei  diferente. Queria fugir do presente que se desenrola sobre um passado que nunca se esquecerá. Queria fugir da revolta e da angústia que invade o coração ao pensarmos "nunca mais". Queria aniquilar com as minhas próprias mãos a morte sempre vencedora.

Corri, sentindo-me estupidamente leve a correr. E quão pesado o coração...

 

E voltei a correr, dias depois, à chuva -  uma chuva miudinha e persistente -  numa pista deserta. Pérolas descidas do céu, beijos em forma de gotas tocavam, suavemente, o meu rosto. O mundo parecia ter desaparecido. Este mundo real, o horizonte próximo dos telhados e janelas fora engolido pela bruma difusa. Só o vermelho da pista sob os meus pés e o verde da relva em redor continuavam vivos e coloridos. Tudo o resto se perdeu no cinzento pardacento de um dia húmido e triste. Gostava da chuva, outrora. Terei que reaprender a gostar.

Voltarei a correr, as vezes que quiser. Não tenho um Plano de Treinos.  Não treino. Ninguém me diga "tens que treinar".  Corro quando quero. Corro sem motivo. Corro com outros motivos.

 

Cântico negro

 José Régio

 

 


"Vem por aqui" — dizem-me alguns com os olhos doces
Estendendo-me os braços, e seguros
De que seria bom que eu os ouvisse
Quando me dizem: "vem por aqui!"
Eu olho-os com olhos lassos,
(Há, nos olhos meus, ironias e cansaços)
E cruzo os braços,
E nunca vou por ali...
A minha glória é esta:
Criar desumanidades!
Não acompanhar ninguém.
— Que eu vivo com o mesmo sem-vontade
Com que rasguei o ventre à minha mãe
Não, não vou por aí! Só vou por onde
Me levam meus próprios passos...
Se ao que busco saber nenhum de vós responde
Por que me repetis: "vem por aqui!"?

Prefiro escorregar nos becos lamacentos,
Redemoinhar aos ventos,
Como farrapos, arrastar os pés sangrentos,
A ir por aí...
Se vim ao mundo, foi
Só para desflorar florestas virgens,
E desenhar meus próprios pés na areia inexplorada!
O mais que faço não vale nada.

Como, pois, sereis vós
Que me dareis impulsos, ferramentas e coragem
Para eu derrubar os meus obstáculos?...
Corre, nas vossas veias, sangue velho dos avós,
E vós amais o que é fácil!
Eu amo o Longe e a Miragem,
Amo os abismos, as torrentes, os desertos...

Ide! Tendes estradas,
Tendes jardins, tendes canteiros,
Tendes pátria, tendes tetos,
E tendes regras, e tratados, e filósofos, e sábios...
Eu tenho a minha Loucura !
Levanto-a, como um facho, a arder na noite escura,
E sinto espuma, e sangue, e cânticos nos lábios...
Deus e o Diabo é que guiam, mais ninguém!
Todos tiveram pai, todos tiveram mãe;
Mas eu, que nunca principio nem acabo,
Nasci do amor que há entre Deus e o Diabo.

Ah, que ninguém me dê piedosas intenções,
Ninguém me peça definições!
Ninguém me diga: "vem por aqui"!
A minha vida é um vendaval que se soltou,
É uma onda que se alevantou,
É um átomo a mais que se animou...
Não sei por onde vou,
Não sei para onde vou
Sei que não vou por aí!



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