Sob um sol fulgurante lutando contra uma réstia de neblina matinal, se fez uma corrida de esperança perene...
Em cada passada se evocavam batalhas travadas e vencidas, lutas perdidas, risos e lágrimas sentidas ao sabor da crueldade de uma doença que, no dia 5 de maio, teimámos em vencer. Naquele que foi um pequeno contributo para um dos maiores desafios da humanidade na área clínica, 3000 pessoas uniram-se, vestiram uma camisola ilustrada pela mão de quem convive diariamente com esse inimigo silencioso, de quem vê a sua juventude ensombrada pelas paredes frias de um hospital e mostraram que não se pode "fechar os olhos ao cancro" (este era o slogan dos bonés distribuídos gratuitamente).
Foi na véspera do Dia da Mãe. Quantas mães ali estiveram presentes...quantas corriam pelos filhos...pelos maridos...pelos pais e pelas mães...
Eu corri, ou melhor, andei mais que corri. Arrastei-me durante aquele percurso, lindo, luxuoso, singular como é o Parque das Nações, naquele momento, o Parque de Todos os Sonhos. Até da água do Tejo, que se espraia já sobre as areias do mar, se levantaram sonhos e povoaram a calçada onde corremos.
Doía-me o pé, coxeava, era a imagem do esforço, mas nada comparável a um outro esforço, a uma outra coragem que tão bem conheço...
E foi ao encontro desse outro olhar de coragem, desse outro esforço constantemente renovado que partimos...
A ela lhe entreguei o meu boné e a camisola com que tinha corrido.
Nela encontrei o mesmo sorriso rasgado nuns olhos cada vez mais tristes...
À espera do "vulcão de água"
Ao lado direito, sobre uma ponte no rio, já os mais adiantados corriam pela esperança
Um aspecto do largo do Pavilhão de Portugal, onde nos inscrevíamos, recebíamos t-shirts e bonés, gelados, água e diploma
Os braços intrincados desta árvore, fizeram-me lembrar o labirinto que se percorre para vencer o cancro...por detrás de cada nó, uma flor aparece...para não perder o alento, para mostrar que há vida...
"Não feche os olhos ao cancro"
Portalegre...Casa do Poeta José Régio...
Cântico Negro...
"Ah, que ninguém me dê piedosas intenções,
Ninguém me peça definições!
Ninguém me diga: "vem por aqui"!
A minha vida é um vendaval que se soltou,
É uma onda que se alevantou,
É um átomo a mais que se animou...
Não sei por onde vou,
Não sei para onde vou
Sei que não vou por aí!"
(Essa é a nossa vida e o cancro)
Um sorriso, à chegada...
Foi por ela que corri
Será por ela que, na terra sua eleita, irei tentar os 30 km...tudo para lhe ver mais um sorriso