existe sempre alguém ...passo e fico como o universo...
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Jul 07
publicado por alemvirtual, às 21:42link do post | comentar | ver comentários (1)

Caía a noite.

O vento tinha amainado e a temperatura era agradável. À  luz do entardecer, os recortes do mar, na praia deserta, emprestavam um ar fantasmagórico à paisagem.

Contrastando com a solidão da orla costeira, uma multidão alegre aglomerava-se em frente às caixas de sardinhas. Revoadas de fumo acre, faziam lacrimejar os olhos, forçando lágrimas que rolavam dos olhos vermelhos das pessoas com quem me cruzava.

Não tinha fome, mas faz parte da tradição desta corrida, a sardinhada e o convívio popular. Também eu me abeirei de um assador, com umas sardinhas gordas e brilhantes no prato. Pacientemente, esperei a minha vez de as assar. Foi uma verdadeira odisseia.

A frescura do banho e o aroma doce do creme, esfumou-se depressa. Bem mais depressa que a tarefa difícil de dourar os meus peixinhos. Em breve, também eu chorava, tentando em vão, escapar ao fumo que se impregnava na roupa e na pele.

Era preciso tomar nota das sardinhas. Estas e estas são minhas. Aquelas daquele senhor. As outras da senhora de mais idade.

E assim se fez noite cerrada.

Triunfante, com o prato de sardinhas na mão, fui para a mesa improvisada no atrelado que servia de fonte. Naquela noite, o vinho escorria pelas gargantas, apaziguando o ardor dos dedos quase queimados e dos lábios crestados ao calor das brasas incandescentes. Nada como um néctar das videiras, rubi e aromático. O frutado do líquido permanecia longo tempo... bocados de pão eram engolidos quase inteiros para disfarçar os lombos crus do peixe que eu julgava bem assado.

 

Abençoada Junta de Freguesia que promove estes convívios.

Mentalmente, deitei contas à despesa. Desisti. Havia imensa fartura de pão, sardinha, febras e entremeadas, vinho e maçãs frescas. Colaborantes zelavam para que nada faltasse. Incansáveis agrupavam os alimentos de forma que, ordeiramente, todos ocupavam a fila certa. Uma para receber o pão e a fruta. Outra para as bebidas. Outra para o peixe e a carne.

Num palco erguido ao fundo, um conjunto popular de raparigas jovens, começou a cantar. A música e as vozes convidavam a um pé de dança. Bailarico no pó do chão e logo uma outra nuvem se juntou ao ar fresco do mar. A maresia dissipou-se naqueles odores fortes e no pó levantado. Inútil o banho, pensei.

Os melhores da classificação geral e de cada escalão iam sendo chamados ao palco. Eu, sendo a oitava do meu escalão não faria parte de grupo nenhum, mas estava ali. Aplaudia. Comia e bebia trocando frases de circunstância com conhecidos e desconhecidos. O meu pensamento estava noutro sítio. Impõe-se, porém a integração em algumas actividades. Há muito tempo que apenas convivo socialmente com o mundo da corrida. Tudo o resto me exaspera. Nunca o suportei muito bem e, cada vez mais, isso se agudiza. Apenas as relações simples, com gente simples, fazem parte da teia estabelecida com o mundo exterior. Criei o meu próprio mundo com pinceladas de cor que lanço, mais ou menos, ao acaso em telas baratas. Criei as minhas próprias preces. Criei os meus próprios sonhos. Criei a minha própria vida e o meu modo de a enfrentar. Noto que a passos largos me afasto da futilidade que sempre odiei e das aparências do ter.

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publicado por alemvirtual, às 10:57link do post | comentar | ver comentários (1)

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Último reduto de mística  paisagem, onde as asas da imaginação se encrespam em sonhos mais intrincados que as moribundas e, ainda assim, furiosas cristas das ondas... 

O imenso oceano estendido à nossa frente, tudo invade, até ao horizaonte difuso.

Tecido bordado a verde e prata, a azul e ouro...

É assim a envolvência de Santo André.

 

Atrás de mim, um espelho imenso de tons azuis profundos, reflectem a calma e contemplativa vida da lagoa. Adivinha-se a riqueza e a abundância nos ares e nas águas...locais de nidificação e habitas de espécies protegidas.

Ali, a meus olhos, o tempo parou e ficou estático, imortalizou-se neste quadro tranquilo entre o verde dos pinheiros, o dourado areal e a calmaria azul das águas quase paradas. Serenei com a serenidade da paisagem.

 

Olhei adiante. À minha frente, um mar imenso, alto, verde e azul, espumando de branco debatia-se furioso, encrespando-se em crinas e ondulação alterosa. O vento sibiliava ainda mais forte que o mar. Mediam forças...os dois...ambos gigantes da natureza...um incorpóreo, mas forte. A sua presença alastra ao longo dos recortes costeiros e arrasta consigo grãos de areia indefesa...o outro, visível, majestoso, misterioso...o que empresta os mais belos tons de verde e azul, ao nosso planeta errante(?)....e eu...aqui, entre o duelo travado...frágil...nesta tormenta de azul e verde, de sol e mar, de vento e frio, para aqui fiquei alguns instantes, deixando que os meus olhos se lavassem na beleza indescrítivel do cenário.

Eu via. Eu vejo. Sempre com ela no pensamento, uma Avé-Maria entrecortada nos lábios, interrogava-me com que força ou que forças me moviam a estar ali. Esse tormento interior ninguém o via. Os olhos do corpo apenas viam a lagoa, e as praias estendidas até ao infinito.

Ela deixou de ver. Há uns dias, o seu sofrimento alastrou-se ao que tinha de mais belo...os seus olhos...enormes, escuros, aveludados como abóbada celeste em noite fria. Agora, grossas lágrimas, silenciosas como ela, desprendem-se e um murmúrio de dor, acompanha-as...Mãe, os meus olhos....deixei de ver....

E eu ali. Tudo via. e Vi-a a ela. Através das ondas que se debatiam e dos desenhos da areia...chorei...mas os olhos do corpo presenciavam um sorriso que cravei nos lábios e uns movimentos de dança ao som da música tocada...

 

Parti. Antes tinha encontrado rostos conhecidos, sorridentes, afectuosos. Senti-me quase querida por toda aquela massa humana. Era como, sem saber eles, me amparassem nesta dor.

 

Nas primeiras passadas, procurei com o olhar alguém que ajudasse no ritmo, me desse alento e estímulo para conseguir alcançar o meu objectivo. Sabia que seria quase impossível, mas queria fazer cinco minutos por cada quilómetro vencido. A vida vence-me. Há muita coisa que me venceu. O tempo gasto foi 47´22´´. Ainda assim, quero sentir-me vencedora.

 

Juntas havemos de vencer.

 

Juntos também, dois colegas de equipa. Ele, experiente, sólido atleta, corredor imparável de maratonas, pés habituados à rigidez do asfalto e à inconsistência da areia, acompanhou-me todo o percurso. Procurou-me até me encontrar. Já com um ardor no peito e a respiração ofegante avançava, contornando corpos suados, passeios saltitados, esgueirando-me sinuosa por entre a multidão. Ficou a meu lado e eu soube que estaria sempre ali, apesar dos meus débeis protestos.

Obrigada António.

Não és só um atleta magnífico, mas uma alma maravilhosa. Quase te abracei de gratidão quando, ainda e sempre juntos, cortámos a meta. Quem sabe, se num futuro próximo, conseguirei ser eu a ajudar outro alguém...Deus te pague.

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