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As coisas vulgares que há na vida
Não deixam saudades
Só as lembrancas que doem
Ou fazem sorrir
Há gente que fica na história
da história da gente
e outras de quem nem o nome
lembramos ouvir
Sao emoções que dão vida
À saudade que trago
Aquelas que tive contigo
e acabei por perder
Há dias que
marcam a alma e a vida da gente
e aquele em que tu me
deixaste nao posso esquecer
...
E com estas palavras de um fado nostálgico, como só o fado sabe ser terminou a reportagem televisiva de um mundo encantado que é o mundo do desporto.
Chamaram-lhe a "Corrida contra o tempo" e fez-me lembrar um post que escrevi há alguns meseS atrás com o mesmo título. O meu falava da corrida pela vida numa tentativa de vencer o cancro que alastrava no corpo da minha filha. Ela, nessa corrida contra o tempo, legou-nos um testemunho maravilhoso de Amor e Coragem, de Força de Viver e Determinação. Ela corria pela vida. Eu corria por ela. Ou melhor, foi nessa altura que comecei a correr.
A "Corrida contra o Tempo" que vi hoje trouxe-me também muita emoção. Lágrimas rolaram-me pelas faces sem que o pudesse evitar. Estava perante um testemunho, igualmente maravilhoso, de um punhado de homens e mulheres veteranos, para quem a Força de Viver, a Coragem e a Determinação são modos de ser e estar na vida.
Que dizer também do espírito de união, da esperança no futuro, da certeza do momento presente e de "nunca ser tarde para começar?"
Se neste ano, na Eslovénia, no Campeonato Europeu de Veterenos não esteve presente um atleta com 99 anos, por estar doente, a certeza com que os seus colegas afirmaram "para o ano vai cá estar a festejar os 100 anos", é fantástica.
Grandes lições de vida que enriquecem quem tem o coração aberto para as receber. Contra todas as adversidades, estes veneráveis veteranos enfrentam, dia a dia, uma vida que quiseram diferente. E não se rendem. Não abdicam do prazer do atletismo, mesmo se os bolsos estiverem quase permanentemente vazios.
É ao ouvir os seus testemunhos que pseudo-atletas como eu têm pensamentos arrojados. Se eles foram a tempo, eu também estou a tempo. E que sensação inebriante esta, de pensar "ainda vale a pena", "ainda sou capaz"...
Mensagem sublime a extrapolar para todas as vertentes da nossa vida. Da minha vida. Correr por vários motivos ou correr apenas quando o motivo é a própria corrida. Nada mais simples, nada mais fácil. Basta querer e não nos deixarmos sucumbir aos tombos e às quedas dadas pelos caminhos.
Não imaginam o bálsamo que foi ouvir essas palavras vindas de quem eu poderia chamar "avô". Calaram fundo no meu coração. Foi como uma promessa feita especialmente para mim.
E Enquanto a bandeira portuguesa subia e desafinadamente se cantava o hino, juntei as minhas lágrimas às deles. Fui feliz com eles. E essa felicidade abriu uma portinha pequena e estreita de um sonho, por onde eu ainda "estou a tempo" de entrar. Onde eu vou querer entrar.
A minha filha tinha muito orgunho na mãe e eu corria por ela. Talvez Deus permita que, continuando a correr, ainda venha a conhecer netos que se orgulhem da avó.
Se já não ouço as palavras "Força Mãe. És a Maior", posso vir a ouvir um dia, dentro de alguns anos, umas vozitas esganiçadas gritarem:" Vamos vovó. És a Maior".
A reportagem valeu por aqueles bravos homens e mulheres e continuará a valer enquanto este espírito do não derrotismo se continuar a espalhar pelos quatro cantos da terra. Os mais velhos têm seguramente um papel primordial na motivação de quem ainda anda "perdido".
Não desistam, por favor. Contamos convosco. Eu quero apanhar esse "comboio".
Também o meu tempo está a contar...tic-tac...tic-tac.
Os meus sinceros parabéns à SIC pela qualidade pedadógica, pelo testemunho positivo de vidas pautadas por valores humanistas e sociais. Valores que já deveriam ser protegidos e defendidos acerrimamente pelo nosso quadro legal porque me parecem estar perigosamente ameçados. (ironia)
O Tempo pode esperar...(10/07/2007)
O que existe para além de cada curva do caminho?
Ela caminhava pela estrada, nem triste nem alegre, apenas diferente. Era uma boneca de corda. Sorriso nem sempre fácil, mas sincero. Olhar profundo e nostálgico.
No reino da fantasia, as bonecas andavam e falavam, pensavam e sentiam. Esta sonhava e seguia uma estrada deserta; vereda trilhada por entre campos verdejantes. Mar verde ondulante em cada brisa de tarde que caía...
Durante muito tempo a boneca andou. Afastou-se da cidade das bonecas que fica no reino da fantasia. E quanto mais se afastava mais tecia a teia de sonhos que buscava em cada curva desvendada.
Alguém lhe tinha prometido um tesouro. Confiante, buscava-o. Um tesouro...fascinante, aliciante...ébria, precocemente, do turbilhão antecipado ao desvendá-lo...endoideceria ao descobri-lo. Doce loucura esta de ser uma boneca diferente em busca de um tesouro prometido.
Sentia a seu lado a presença de alguém. Há algum tempo que o som dos seus passos o denunciava. Presença insignificante quando se fita o futuro, presente em cada passo mais além...
E seguia...parecia ter percorrido uma imensidão. Parou para descansar. O som dos passos que a acompanhavam prosseguia...primeiro nítidos, ali perto...quase palpáveis. Depois cada vez mais indistintos à medida que avançava.
Súbito, com a sua vozita timbrada de boneca, gritou aos passos que se perdiam:
- Como te chamas? Pode ser que saiba onde encontrar o tesouro que procuro - pensou. Até pode ser que o encontre antes de mim...
O eco devolveu-lhe a sua voz e logo outra, ampliada pela solidão do espaço:
- Sou o tempo...tempo...tempo...
Ergueu-se.
O tempo passou aqui. O tempo passou por mim e eu deixei que o tempo passasse.
Era esse o tesouro que procurava, compreendeu.
E quis agarrar o tempo.
Boneca de corda, no reino da fantasia...
E o tempo esperará por ela?