Arde em mim, um amor eterno e puro
Sempre puro é este amor de mãe
Roubou-te a morte a vida do futuro,
Já te não vejo sorrir tão docemente.
Foi breve, brevemente esta passagem
Eis quão miserável é alguém
Se de ti não resta mais que a lembrança
Não te vejo, porém sinto
fortemente
A luz do teu olhar que foi de esperança
É essa a luz que iumina
cada dia e as noites tão sombrias
Sem te ver, revivo, pois que vivo
os dias e as noites em que morrias;
As tuas mãos pequenas afagavam
As mãos já cansadas desta mãe
Partiste, para além.
Onde estás? Longe? Perto? Aqui ao lado,
Eu fiquei, desamparada,
desenganada dos gritos de promessas incumpridas,
em palavras, fracamente sussurradas,
morria a voz em sopros de coragem
Quis ir. Não fui. Fiquei e tu a ir...
A partir sozinha,
e eu chorando,
nessa viagem
da qual nada sei, mas que anseio
partir do mesmo cais onde fechaste
o doce olhar à luta que travavas.
Fiquei ali olhando o corpo inerte,
as mãos de seda pura entrecruzadas
o teu rosto tão belo, tão sereno...
Que de tão etéreo me parecia
Olhar para um anjo das alturas.
Há dias de sol, tal como ontem e dias sem sol, tal como hoje.
Há dias e pessoas com sol e dias tristes e sombrios como outras pessoas.
Há vidas sem sol e vidas com sol. Sobretudo, há pessoas radiosas como o sol e pessoas que teimam em espalhar sombras na vida, como uma nuvem cinzenta encobrindo o sol. Há pessoas que vivem zangadas com a vida, com os outros e com elas próprias. Reclamam. Lamentam-se. Afundam-se em acessos de raiva mal contida, de frustração infundada e em egoísmo no seu reduzido mundo. Nada basta. Nada é suficiente. Nada é justo. E os dias escoam-se...e a vida passa...e arrastam consigo o travo amargo do descontentamento...
Eu tenho um sol na minha vida. Mesmo com o céu cinzento e escuro ela descortina sempre um raio de luz para alegrar o seu e o meu dia. No jovem firmamento dos seus dias, nuvens espessas, ancestrais no seu destino, teimam em mostrar a sua face sombria. Numa coragem indescritível ela acredita que, para além desse manto escuro, existe um pedaço azul à sua espera. Gosto de pessoas assim. Todos deviam ser assim. É maravilhoso partilhar a vida com alguém que continuamente agradece a dádiva de cada dia, apenas porque vive cada momento. Sem desistir, sem esmorecer, numa luta sem tréguas contra o desânimo. Inconformada...estóica, como só ela consegue ser.
Quando entrei no autocarro, chovia. Uma chuvinha persistente tombava do manto cerrado do céu. Chorava. Lágrimas caíam... discretamente, sulcavam a face da mãe. Chovia. As nuvens também choravam. Talvez fundidas na mesma dor... De mãos dadas, silenciosamente... No hospital, o sol brilhou. No olhar profundo de uns enormes olhos castanhos, a luz afugenta a sombra do dia.
O coração de mãe sossegou. E as nuvens deixaram de chorar...
A.P. Fevereiro de 2007