A minha relação com estes serviços nunca foi pacífica. Continuo a somar "descontentamentos" que reforçam a visão negativa que tenho da sua lógica de funcionamento.
Recebo uma mensagem do meu filho antes das 7 da manhã a pedir para o levar ao médico.
Convém voltar um pouco atrás e dizer que estou "hospedada" na casa de uma amiga perto da Charneca da Caparica (situação encontrada depois da ruptura familiar, uma vez que o meu local de trabalho aí se situa). Ele (o filho) está hospedado numa outra casa em Lisboa, a fim de dar contnuidade aos seus estudos. Ambos, temos residência oficial no Entroncamento, para onde nos deslocamos no final de cada semana.
Até final de Dezembro último éramos utentes do Centro de Saúde da Sobreda, com médico atribuído. Devido à alteração da situação pedi transferência para o Centro de Saúde do Entroncamento.
Ora, quando alguém adoece necessita de cuidados médicos, não é verdade? Ainda para mais, sabendo da "aversão" ao seu recurso por "dá cá aquela palha", ao receber a mensagem de que estava doente, era certo ser mesmo verdade.
Onde vou? Foi logo o que pensei. Ora bem, vou buscá-lo a Lisboa, trago-o ao Centro de Saúde da Sobreda e depois logo se vê a gravidade da situação. Não entro em alarmes.
Como ao dirigir-me para a minha escola a fim de avisar de que iria faltar, passo mesmo em frente ao Centro de Saúde, tenho a brilhante ideia de entrar e expor sucintamente a situação:
- Já não somos utentes deste Centro, mas preciso de uma consulta para o meu filho. Ele está em Lisboa, vou buscá-lo e venho aqui. Pode ser atendido?
- Não- respondeu-me prontamente a funcionária. Tem que ir ao SEU Centro.
- Mas o MEU centro é a 160 Km daqui e ele está em Lisboa.
- Então tem que ir a Lisboa.
- Mas onde? Não conheço nenhum Centro em Lisboa, não me oriento na cidade e a este eu SEI vir. Além disso é o Centro ao qual estivemos vinculados durante alguns anos e até há pouco tempo atrás.
- Pois, vá ao Centro que ficar mais perto dele.
- Não sei qual é. E se tem direito a ser atendido em qualquer Centro, em situação de ausência do local de residência, para mim é mais funcional vir a este.
- Mas tem que ir a Lisboa.
- Não entendo porquê. Está inscrito no Entroncamento, se tem que recorrer a um serviço fora e este é o que conheço, não pode vir? Já expliquei que é mais funcional e fácil para mim, ir a Lisboa e voltar aqui, do que procurar um sítio que não conheço. Se lhe perguntasse se sabe onde fica o do Entroncamento, a senhora saberia? (pensava eu que a senhora iria compreender que "quem não sabe é como quem não vê", como era o meu caso).
- UTILIZAVA UM GPS. - Foi a resposta pronta.
- Mas eu não tenho nem sou obrigada a ter um GPS. Então não pode vir aqui?
- Não.
Agradeci e saí.
Não sou obrigada a ter GPS. Não admito este tipo de resposta num serviço público, nem em qualquer outro serviço. Apenas teria que responder não pode ser atendido aqui e apresentar as razões, se tal estivesse dentro da sua competência. Como aparentemente não existe razão nenhuma, uma vez que qualquer outro centro serviria, ainda fiquei mais aborrecida. Mas na verdade, o que me "tirou do sério", o que me indignou foi a resposta que considero uma falta de respeito.
Conclusão: fui a Lisboa buscar o miúdo e dirigi-me ao Entroncamento para recorrer ao Centro de Saúde, evitando andar às voltas numa cidade que não conheço e que seria causa de stress para mim. Fácil? Sim, sem dúvida para quem conhece e tem sentido de orientação. Ir a um grande hospital? Sim, saberia ir a um, mas não fui. Evitei entupir as urgências, pois acho que urgência é mesmo para isso e não me parecia o caso. Mas parece que os meus cuidados (que afinal não são nada mais que a obrigação de qualquer cidadão) são excessivo zelo no cumprimento dos meus deveres.
Há algum tempo atrás, recorri duas vezes ao Centro de Saúde (Sobreda). Tinha a minha filha em estado terminal e precisava de ajuda médica. Por duas vezes tive que reclamar. Invariavelmente, quando pedia a consulta ao balcão, a funcionária administrativa (a mesma) perguntava:
- "O que é que tem?"
- Minha senhora, a isso não respondo.
- Então não marco a consulta. São ordens. TENHO QUE AVALIAR a situação.
- Pois eu não tenho competência científica para fazer diagnósticos e também não lhe vou explicar mais nada. Se peço uma consulta é porque necessito, caso contrário não estaria aqui. Essas perguntas transcendem-na e a mim assiste-me o direito de não lhe responder.
- Então, fale com quem determinou estas ordens.
E eu assim fiz. Falei. Discordei e reclamei.
Cada funcionário tem funções perfeitamente estipuladas e não podem ultrapassar as suas competências.
Tal como eu.
Segundo a Organização Mundial de Saúde " Saúde é um estado de completo bem-estar físico, mental e social, e não apenas a ausência de doença."
Quando solicitei atestado médico em virtude do estado terminal da minha filha, dizendo que não me sentia em condições para continuar ao serviço, indignei-me porque foi-me respondido pelo médico que "A Ana Paula não está doente. Se tivesse uma perna partida, não poderia ir trabalhar, mas assim, não".
Neste caso, eu respondi-lhe com uma pergunta:
- O senhor Doutor tem filhos? Não, bem me parecia. Se tvesse uma filha a morrer com cancro e tivesse que trabalhar, sendo o seu trabalho intelectual e afectivo (sabe que apoio crianças com NEE e duas delas também tiveram cancro), saberia que não reúno as mínimas condições para realizar o apoio que elas merecem e que eu sou obrigada a dar. Mais facilmente iria trabalhar de canadianas do que com as duas pernas sãs e a cabeça e o coração desfeitos.
Parece que o conceito de saúde ainda não é bem entendido por todos os profissionais da área...
Ainda com o mesmo médico. Meses antes da Margaret falecer tinha marcado duas consutas. Uma para mim e outra para ela. A minha seria rotina (nunca faço exames e pensei nas coisas normais na minha idade) e sugeri também um RX aos pulmões, pois fumava (e fumo) bastante. A consulta da Margot seria mais burocrática pois tinha a ver com registos do IPO que transitavam para o seu proceso clínico. Entrámos as duas ao mesmo tempo para o consultório. Eu, sendo a primeira a ser consultada, expliquei que gostava de saber como andava o meu "corpito": análises, mamografia, rx, por causa do tabaco.
Resposta pronta do médico que fez a Margaret rir bandeiras despregadas e eu também, quando saímosdo consultório (sei que foi riso nervoso):
- Acho bem que faça análises e tudo o mais, mas o RX, olhe Ana Paula, só se tiver cancro é que se vê. E se tiver já é tarde, não há nada a fazer.
E voltando-se para a minha filha:
- E a menina, o que é que tem?
- Tenho cancro - respondeu a minha filha.
Pobre senhor. Sei que se tivesse um buraco ter-se-ia enfiado nele, mas já era tarde para apagar as palavras que tinha dito...
A quem teve "pachorra" de ler o desabafo, as minhas desculpas. Fez-me bem "destilar" a impotência que sinto quando esbarro com este tipo de situações.