Como cão que é, claro! Não eu, mas ele. Chama-se Dharma. Tem um focinho "aterrador" com um olhar de uma imensa ternura. "Casca grossa" como a "dona". Por outras palavras, a brutalidade é mais aparente. Por fora parece bicho ruim. Por dentro, o bicho, em vez de coração, deve ter um favo de mel. O que de mais agressivo faz na vida é chorar como uma criança se, por acaso, fica só. Raio de cão este!
Adiante...
Já era tempo de voltar a correr. Hoje, pela manhã, ocorreu-me a brilhante ideia de arranjar companhia. Indecisa deixo passar algum tempo. O sol vai tomando força. A temperatura aumenta. Ora... nada que não seja suportável. Olho várias vezes para o cão.
Vou buscar a trela e os seus acessórios. Mal levanta a cabeça, dorminhoco. Pensando que vai dar apenas um passeio, decide-se a erguer, ainda meio trôpego; Abana o rabo satisfeito e olha para mim, como se visse a Madre Teresa de Calcutá (sem a mais leve ofensa, já que admiro porfundamente a sua obra e sou cristã, católica e assumo em todo o lado a minha fé).
A primeira meia hora foi fantástica. Eu sentia-me leve. Sem treinos dignos de registo, estava admirada comigo mesma. O cão, esse com menos treinos ainda, parecia não perceber que o ritmo se deve manter. Mas não. Puxava com força e corria feliz. Eu mal o podia acompanhar. Comecei, entretanto, a ouvir uma respiração ruidosa e ofegante. A língua atirada para um lado aumentava de tamanho a olhos vistos. Temi que arrojasse no chão. Tínhamos passado há uns minutos atrás pela zona relvada do Complexo Desportivo, onde os aspersores regavam a relva. Na altura pensei que, ao regressar aí nos iríamos refrescar. Eu e o Dharma.
O ritmo do cão decrescia, até já não passar de um andar arrastado. Fez menção de parar, várias vezes. Incentivei-o a prosseguir. Até ao limte das suas forças (que são muitas).
Ao aproximarmo-nos, de novo, da zona relvada, mais fresca e aprazível, o pobre do bicho já caminhava lentamente. Arrastava-se com esforço. Resolvi andar. Solidariamente com ele, lá chegámos. mas os repuxos já não deitavam uma gota que fosse. Que decepção.
Eis-nos com os pés na relva. Molhada, encharcada, em alguns pontos. Foi demais para o bicho. Desistiu. Mandou-se para chão e aí ficou, patas esticadas, como frango no churrasco. Bebeu das poças de água que se tinham formado. Arrastou-se escassos centímetros para beber de novo. Os meus pés afundavam-se na água e os meus lábios abriam-se num enorme sorriso. Maior ainda que o dele. Aquela boca escancarada; os olhos suplicantes; o pedido mudo "Deixa-me aqui. Estou de rastos como um cão"...
E eu deixei...por longos minutos.
Mas tínhamos de chegar a casa. Pata aqui, pata ali, pata acolá... tropeções nas escadas. Engano na porta (queria entrar logo para o 1º andar). Por fim, a salvo! Fugiu de mim como Diabo da Cruz. Foi a minha vez de me arrastar. Melhor, de me arrastar porque o arrastava a ele até à banheira. Bem o puxei e empurrei. Pesa quase tanto como eu e, uma corpo em recusa, pesa ainda muito mais! Enfim, lá colaborou e saltou para dentro. Chuveirada no Dharma... Sacudidelas que me encharcaram... Inundações como se um cano tivesse rebentado...
E a esta hora ainda o pobre do cão está na posição "frango no churrasco".
Corridas? Bahhh...não me revelo interessado....
O Dharma e o seu super sorriso (antes da corrida, evidentemente)