existe sempre alguém ...passo e fico como o universo...
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Mai 12
publicado por alemvirtual, às 22:19link do post | comentar | ver comentários (2)

Dia 1 de maio. Dia do Trabalhador. Dia de todos os trabalhadores; daqueles que lutam diariamente pelo "pão para a boca" e daqueles que já lutaram por ele. Sem desistir; sem baixar os braços; antes erguendo-os, perante as adversidades da vida, das más condições, da opressão, ou da exploração. É em homenagem aos trabalhadores de hoje e aos que atribuíram significado a este dia, que o 1º de maio se assinala, um pouco por todo o lado. Também em lugares "perdidos" no tempo, que apenas a memória e o esforço de preservação da cultura dessas comunidades, mantém vivos, ou teimam em reavivar e reviver. Tal como na "Barreira da Bica".

 

Integrada nas comemorações do 3º Dia do Avieiro, decorreu ontem, dia 1 de maio a 1ª Estafeta Avieira. Organizado pela Associação para a Promoção da Cultura Avieira, o CCD o Alvitejo, o Industrial Desportivo Vieirense e as Juntas de Freguesia de Vale de Figueira e de Vieira de Leiria este evento desportivo uniu dezenas de atletas, ligando num percurso de 95 Km a Praia da Vieira e a Barreira da Bica. As equipas eram constiruídas por onze elementos, realizando percursos que variaram entre o mais pequeno da Praia da Vieira a Vieira (3 km), a percursos de 10 ou mais km.

 

Barreira da Bica, na freguesia de Vale de Figueira, é um lugar idílico, de um verde intenso na confluencia do Alviela com o Tejo. Aqui, existiu, em tempos não muito recuados, uma aldeia Avieira. Uma das muitas dezenas ao longo dos rios. Presentemente, aqui, placas identificativas assinalam o sítio exato onde existiam as "barracas" - termo com que os avieiros designavam as casas palafíticas que construíam para fugir à impetuosidade das águas, sobretudo em época de cheias - e o nome dos seus habitantes. A vida que inicialmente, aquando da sua migração da Vieira para as águas do Tejo e do Sado, a partir do século XIX,  era confinada ao espaço barco onde "nasciam e morriam", foi gradualmente instalando-se nas margens; as barracas cederam, pouco a pouco lugar às "casas" de madeira assente em estacas. O nosso imagético de  "barraca" contrasta em muito com o colorido intenso das mesmas. Mas agora, importa sobretudo dar "corpo" aos passos corridos num percurso simbolicamente batizado de "Estafeta Avieira".


Antes de se instalarem de forma permanente nas margens do Tejo e do Sado, os avieiros realizavam este percurso sazonal de ida e volta, partindo da Vieira quando os rigores do inverno e a bravura do mar lhes dificultava as artes de pesca, e quantas vezes roubando-lhes a vida, vindo procurar nas águas mais calmas dos rios o sustento. Partiam depois para a praia de origem. Constituíram comunidades de uma cultura vincada, própria, a qual (roubando as palavras de Alves Redol) poderíamos comparar ao povo cigano, nómadas em terra. Os avieiros eram "ciganos do rio".

Foram ficando...E ficaram as marcas da sua cultura...E essa cultura é parte integrante da nossa identidade, "povos" da Lezíria e da Borda d´Água.


A Cultura Avieira está em fase de constitiição de Candidatura a Parimónio Nacional e Imaterial da Unesco. "Descoberta" há alguns anos através de uma investigação no campo académico, rapidamente extravasou os limites desse estudo, agregando a si diversas áreas, entidades, associações e instituições. É um projeto de afetos e um projeto cativante. Cativa pela singularidade do seu objeto. Cria afetos pelos laços que se estabelecem e pela experiência completa de reviver os tempos árduos, mas simultaneamente felizes do povo avieiro.

 

A Estafeta, uma prova desportiva por etapas, privilegia o sentido de grupo, da luta da equipa pelo mesmo objetivo. Tal como os avieiros. Eram um grupo. Eram uma família. Eram uma comunidade. Hoje, tal como ontem, este sentido permanece, embora as condições de vida se tenham alterado. E para que esta cultura tão própria não morra, se passa "testemunho", se divulga e se preserva.

Na prova, o Testemunho passado de mão em mão, chegou à Barreira da Bica. Era um remo. Apenas um pequeno remo de madeira, réplica dos remos das bateiras que as mãos calejadas das mulheres avieiras manobravam.

Um prova em tudo simbólica, num dia igualmente simbólico de reencontro de avieiros, de convívio, de partilha e de reflexão. De renovação do firme propósito de fazer reviver a cultura dos "ciganos do rio". Para que a sua "vida" não morra e não morrendo, enriqueça a vida de todos quantos vivem. Hoje, amanhã e no futuro distante...

 

No próximo ano, a 2º Estafeta Avieira decorrerá, provavelmente, no sentido inverso "Barreira da Bica", ou outro lugar avieiro (Patacão, por exemplo) até Vieira de Leiria. Quem sabe, as duas equipas deste ano poderão ser multiplicadas por muitas outras. Gente amante do atletismo e apaixonada pelo nosso património, tangível e intangível.

 

Já nos imaginámos a fazer uma corrida de regresso ao passado? Pois foi o que aconteceu, ontem. Regressámos ao passado através dos passos de corrida dos atletas e de muitas outras atividades que não cabem, propriamente, numa crónica de corrida de uma pseudo atleta, emocionada na linha da Meta e de uma apaixonada pelos pescadores de Borda d´Água, na linha de Partida.

 

A todos os elementos organizadores e aos que apoiaram a sua concretização, sem esquecer o imenso trabalho voluntário desenvolvido, um agradecimento especial. Permitam sublinhar a ação dinamizadora do senhor José Gaspar, de Vale de Figueira e membro da Associação para a Promoção da Cultura Avieira.

Decorreu tudo (e foram várias as atividades) de forma excecional. Os sentimentos recorrentes eram "estou feliz" e "acredito no renascimento da cultura dos meus avós, dos meus pais e na recordação da minha meninice".

 

A Barreia da Bica não é só frescura, água e verde. Neste dia, foi corrida, peixe frito e pão caseiro, vinho tinto e muitas histórias de sorrisos.

 

 

 

 

Parabéns aos atletas. Parabéns à Organização. Reconhecidamente gratos aos apoios e patrocínios. Para o ano haverá mais! Contem comigo.

 



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