Depois de uma curva surge do nada. Irreal, altaneiro sobre as águas, como se supenso descido do céu, desvenda-se o castelo aos olhos de quem passa. Este é o meu Castelo. Castelo de mouras encantadas, de lendas, de lutas e de vitórias. Sempre vitórias...
O rio vai calmo. O leito voltou ao curso normal. As margens são verdes, bordadas a ponto de malmequer, de cardos e giestas e cheiro de flor de laranjeira.
Há quem seja dono das estrelas. Seja dono de sonhos. Eu sou dona de um castelo. Um castelo feito de sonhos e um sonho em forma de estrela. A minha estrela é única. Não ocupa lugar fixo na abóbada celeste. É uma estrela mágica. De manhã cedo, muito cedo, pinta o céu de azul... E assim fica, em tons de cristal azul. O Sol ri-se. Acho que gracejam todo o dia. A estrela-sol e a estrela-azul (sei disso, porque foi a moura do castelo que me contou...). À noite, disfarça-se no meio das outras. Escolhe um lugar do negro profundo, das entranhas do infinito para continuar a sorrir. Eu vejo-a. Outras vezes, brinca comigo à escondidas (porque o sol se foi deitar) e brilha, ainda mais, em alguma constelação distante.
Quando se corre na margem do rio, dá-se a mão à fantasia. Lá ao longe, emergindo da rocha, é o castelo sólido que nos olha. Aqui perto, tão perto que não se vê, a forma difusa da ninfa diáfana que brinca na margem.
Continuo correndo, enebriando-me com a flor de laranjeira, as papoilas e os malmequeres; As azedas, as giestas, as estevas, os cardos e o lilás florido de uma árvores cujo nome já esqueci...Tanta cor. O mundo é feito de cor. E depois há a cor da água, a cor da rocha, a cor da terra, a cor das aves, a cor verde que cobre os campos, este mesmo verde que corre em direcção ao céu e se transforma em azul profundo. E há a cor dos sonhos e dos castelos. A cor da carne e a cor da viva.
Vejo os meus braços que oscilam no ritmo da corrida. Ouço os passos no caminho; a água que corre também, os pássaros lá nos ramitos, uma voz perdida ao longe...
E da cor perco-me no som. Um violino toca para mim. Apenas um, mas com ele toda uma sinfonia...
Por ali fico, olhando o castelo. Apenas uns instantes.
Voltando as costas ao castelo, corre-se na direcção inversa. É voltar as costas ao sonho, mas sei que ele espera por mim. Todas as vezes que quiser vir. Em cada dia que quiser correr. O castelo e os sonho... As estrelas e a moura...
É assim. O castelo alberga história. As histórias tornam-se lendas. Eu ouço-as no eco dos passos de corrida.
Não sei por que se corre, mas eu gosto de correr. Não sei por que se gosta, mas sei que quero correr...